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domingo, 6 de setembro de 2015

Aylan morreu sem conhecer a paz

Por: Duda Teixeira


Tragédia humanitária – O bote de 5 metros de comprimento em que o menino sírio Aylan Shanu viajava com os pais e o irmão mais velho emborcou a caminho da Ilha de Cos, na Grécia(Nilufer Demir/AP)

Quem poderá afirmar com certeza que Heródoto, o filho mais famoso de Halicarnasso, hoje Bodrum, na Turquia, não tenha chutado distraído em uma caminhada pela praia um dos seixos que cercavam o corpo de Aylan Shenu? Como a injustiça e as guerras, os seixos resistem indiferentes ao passar dos séculos. Heródoto viveu 59 anos no século V a.C. Foi o primeiro a fazer relatos realistas, minuciosos e críticos de eventos da Antiguidade clássica. É chamado de "o pai da história". Aylan tinha 3 anos. Todos eles vividos sob a guerra civil síria, um conflito do século XXI mais bárbaro e desumano do que os narrados por Heródoto, que tiveram lugar há mais de 2500 anos, quando inexistiam conceitos como direitos humanos, respeito à vida ou proteção às crianças. Hoje esses conceitos são automaticamente recitados pelos homens públicos. Aylan morreu sem desfrutar nenhum deles.
Há uma pequena chance de que a morte de Aylan seja o marco do limite máximo do descaso com a maior tragédia humanitária de nosso tempo, a dos imigrantes que se lançam ao mar em embarcações precárias depois de perder a própria pátria. O bote de 5 metros de comprimento em que o menino sírio viajava com os pais e o irmão mais velho emborcou a caminho da Ilha de Cos, na Grécia. Eles fugiam dos terroristas do Estado Islâmico, que, em nome da construção de um califado, matam pessoas de todos os credos, torturam e estupram. Fugiam também das forças do ditador Bashar Assad, que bombardeiam o próprio povo com armas químicas. Quando Aylan nasceu, a Síria já estava em guerra civil. Ele morreu sem conhecer a paz.
Somente neste ano, cerca de 2600 pessoas morreram buscando chegar à Europa pelo mar, dos mais de 300000 que tentaram a travessia. Nos últimos dias, as multidões atravessando fronteiras com pouco mais do que a roupa do corpo em trens, a pé ou de bicicleta abriram, com a força do maior fluxo de refugiados desde a II Guerra Mundial, fendas nas bem guardadas fronteiras dos países europeus. Os que sobrevivem à travessia não são bem-vindos na Europa. Eles são muitos. São pobres. Muito diferentes. São vistos como ameaça. "Os que estão chegando cresceram em outra religião e representam uma cultura radicalmente diferente. A maioria deles não é cristã, mas muçulmana. A Europa tem uma identidade enraizada no cristianismo", disse Viktor Orban, o primeiro-ministro húngaro, cujo governo está terminando uma cerca de arame farpado na fronteira de seu país com a Sérvia para impedir a entrada de novos clandestinos. A reação de Orban reflete o sentimento de um número expressivo de moradores da Europa. Os europeus têm boas razões para reagir defensivamente. Os imigrantes não têm alternativa. A situação em que os dois lados de um conflito possuem razões legítimas e lutam para impô-las à força tem o nome de tragédia.
Palco de duas guerras mundiais, revoluções sangrentas e conflitos étnicos recentes, a Europa está cansada de tragédias. Essa é a chance de que a morte de Aylan seja um marco de mudança para melhor na situação dos fugitivos. A chanceler alemã Angela Merkel, com o bom-senso e a determinação que a caracterizam, falou como uma líder: "Se a Europa falhar na questão dos refugiados, essa não será a Europa que sonhamos". Do cenário de desolação e abandono deixado pela II Guerra Mundial os europeus se reergueram com a ambição de ser a antítese do passado intolerante e sangrento. "A dignidade humana é inviolável. Respeitá-la e protegê-la é dever de toda autoridade do Estado", lê-se no primeiro artigo da Constituição alemã de 1949.

Um comentário:

  1. Foi o Aylan ... Haidar e Zainab , http://www.ndtv.com/world-news/iraqi-family-buries-children-who-drowned-with-aylan-1215846 , milhares de euros para traficantes ao dispor de um barco velho e nem uns pouquitos euros para uns coletes , tinha de acontecer ou melhor de alguma forma acontece a todos por variadas maneira , ninguém cá fica para contar ... apenas a história para se ler um dia ... daqui a 100 anos .
    Mas o que interessa é saber porque existe tudo isto , culpa de Obama que recebe um Nobel da paz retirando 90 % das tropas do Iraque e afins de um dia para outro mergulhando aqueles países numa guerra civil abismal ?
    Lembram-se de na guerra do Iraque os Americanos ficarem abismados de não terem encontrado armas de grande porte ?
    Agora apareceram nas mãos do ISIS !
    Tanto tempo agora para resolverem a guerra aquém interessa tudo isto ?
    Quem patrocina as campanhas do ISIS ?
    Eu sei , a quem lhes compra petróleo a preços dados e com umas armas em mistura de oferta !

    Não me quero estender porque não sou "tapado" ... mas o que as TV´s mostram ao público e o que os governantes falam nem 10% mostra a barbaridade do ISIS e a razão porque fogem as pessoas ... ao fim ao cabo em Portugal existe desemprego , fome e miséria mas estou certo que os nossos jovens não nascem no abismo do terror .

    Vejam estes vídeos ou fotos e saberão que Portugal embora tenha nascido num desacordo entre mãe e filho ( Afonso Henriques ) , ainda é um paraíso ou pé disto :
    http://heavy.com/?s=isis


    Milhares de Aylans já morreram na Síria ... outros milhares vão morrer a fugir ... e não acabam com a guerra na Síria ... porquê???

    bike_evora@aeiou.pt

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