Por Major Fábio Dias
Violência e criminalidade sempre farão parte da convivência humana, o que se procura é evitar que seus índices cheguem a uma situação insustentável, a ponto de impedir a garantia do Estado Democrático de Direito, conforme a carta magna de 1988, a Constituição Federal.
A criminalidade é um fenômeno social, já identificado assim no final do século XIX como um fato próprio da existência humana, portanto fato social. (DURKHEIN, 1897).
É preciso entender a evolução da sociedade. Segundo Foucault, até a
década de 90 ela era disciplinar, chamada era da sociedade circular,
onde o tempo (transformação tecnológica) passou a avançar em formato de
espiral – onde o passado não existia e o futuro muito menos – sem
terminar nunca. É o chamado tempo das coisas inconclusas. Este tempo, na
visão de Bauman, significava inclusive, dinheiro, segregando os
consumidores em válidos e inválidos, estes sem recursos financeiros. A
sociedade foi evoluindo, através dos períodos do Pós-Taylorismo,
Pós-Fordismo e da Informática até chegar a sociedade Pós-Disciplinar ou
Pós-Moderna. A criminalidade também acompanhou esta evolução.
O fato social é distinto do livre arbítrio e conseqüência das forças coercitivas da coletividade. É algo mensurável e que difere da vontade humana individual, a qual encontra as estruturas sociais prontas, não é decisão do homem incorporar ou participar destas formas de convívio, elas existem independente da vontade de cada um e obrigatoriamente somos integrados a elas. (GIDDENS, 1976)
A sociedade atual é altamente consumista “compro, logo existo”. Como
controlar este consumismo desenfreado que movimenta a economia e
contribui para o aumento da violência? Este é mais um desafio. Em estudo
realizado no ano de 2004 pela Fundação Getúlio Vargas, no Brasil
chegou-se a conclusão que existiam nas favelas cariocas mais televisores
do que geladeiras.
Os mesmos anseios e desejos das camadas mais ricas ocorrem também com
os jovens das classes menos favorecidas. É a nova religião consumista
“Nike” fazendo com que estes jovens (excluídos sociais) utilizem de
mecanismos ilícitos para satisfazer suas vontades, sendo facilmente
recrutados pelo mundo do crime. Existe, na verdade, uma relação entre
pobreza e criminalidade; relação esta não de causalidade, mas de
potencialização (a pobreza potencializa o crime).
No passado, havia a escassez de recursos. Hoje, há abundância de determinados produtos. Segundo Bauman, as pessoas se tornaram abundantes, repetitivas e este sujeito redundante é interpretado como lixo, gerando exclusão por parte da sociedade, sendo uma das causas da violência.
No passado, havia a escassez de recursos. Hoje, há abundância de determinados produtos. Segundo Bauman, as pessoas se tornaram abundantes, repetitivas e este sujeito redundante é interpretado como lixo, gerando exclusão por parte da sociedade, sendo uma das causas da violência.
Não há transformação social que não seja alcançada pela participação dos agentes de saúde, dos agentes de segurança e dos educadores; pois estes agentes inspiram a formação moral dos agentes coletivos. (BALLESTRERI, 2006)
O clamor social pelo combate à violência e a criminalidade passou a
se intensificar a partir do momento em que começou a incomodar as
classes privilegiadas desta sociedade desigual. Esta sociedade
Pós-Moderna acabou por anular a força de trabalho. As pessoas acabaram
buscando a informalidade que, por conseqüência, acabou gerando violência
e aumento da criminalidade. É o ciclo do crescimento desordenado.
É preciso estudar a juventude para entender a criminalidade. A
violência vem de se estar no mundo, da compulsão de se estar junto. É o
mal-estar da sociedade, segundo Freud. Quando se restringe o espaço
entre os seres humanos, aumenta-se a intolerância, o que também
contribui para aumentar os índices de violência, corroborando para o
chamado “niilismo social”, que contagiou a juventude nacional, oriundo
desta sociedade contemporânea, altamente individualista, sem passado e
sem futuro, onde o que se é levado em conta é o presente. O tempo mudou a
forma de nos relacionarmos com as pessoas, onde qualquer situação
desfavorável faz com que se descarte o outro. Está ocorrendo uma perda
na durabilidade das relações. É o chamado “mundo novo”.
Algumas instituições permaneceram sem acompanhar a evolução da
sociedade, perderam sua própria identidade, algumas chegaram a ser
extintas. Atualmente, mesmo buscando a inclusão social, o controle da
criminalidade vai se dever à atuação do Estado. Vivemos a chamada
“democracia radical”, onde o cidadão não transfere a responsabilidade
para os políticos, ele mesmo a assume.
Diante deste quadro de violência, onde vigora a teoria da anomia – a
norma estabelecida deixa de ser referência para o cidadão; onde este,
por estar descrente, passa a descumpri-la – inúmeras políticas públicas
tentam minorar os estragos causados pela violência e criminalidade.
Entretanto, parafraseando o saudoso Profº Gey Espinheira, somente
soluções globais poderão ajudar a conter esta violência e, uma delas,
seria o reconhecimento e o respeito aos direitos, de uma forma geral.
Foi assim com as mulheres, as crianças e mais atualmente com os idosos. A
sociedade aprendeu a controlar a mortalidade das baleias, tartarugas e
micos-leões-dourados, mas ainda não conseguiu minorar as consequencias
advindas dos altos índices de homicídios, muitos dos quais insolúveis,
aumentando a sensação de impunidade. Até quando navegar nesse mar de
passividade? Até quando?
*Fábio Nascimento Dias é Major da PM,
atualmente comandando a 5ª CIPM - Ilha de Itaparica -BA, Especialista
em Políticas e Gestão em Segurança Pública pela Escola de Administração
da UFBA/SENASP/2007 e Especialista em Segurança Pública pela
Universidade Estadual da Bahia/APM/2008.
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